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terça-feira, 20 de maio de 2008

A Deusa e a Dança

E um dia eu descobri a Dança. Ou talvez, sendo mais sensata, a dança me descobriu.

E com as ondulações inseguras de meus braços, o infinito representado pelos meus quadris, eu a vi. E sua face era bela, embora ainda oculta pelo véu da minha rigidez, de antigos costumes que eram mais bárbaros que glorificar meu ventre como fonte de vida. Mais bárbaros que o sacrifício do Deus que banha a terra com sua fertilidade.

Ela me olhava e se movia me incentivando a acompanhá-la, a romper o véu, a transgredir as falsas regras, a cultuar a forma feminina que habita meus próprios contornos.

E Ela estava lá; estava lá quando pouco a pouco o véu se esvaiu. Estava lá quando notei que minha nudez não era vergonhosa, e estava lá quando me banhei da luz da aurora e recebi o Deus.
Dançavamos juntas e meu véu agora ondulava ao vento, e era levado pela suavidade da brisa que exalava de Sua respiração.

E ela ria, e seu riso me parecia o som das águas na cachoeira.

E de sua dança, a vida surgia. E de sua dança, a minha alma se cobria de cores, cheiros e sabores. E descobri o mundo.

E ela continuava a meu lado, quando meu coração desabrochou como a rosa ao contato do orvalho, e vi, que nas pequenas formas, que no meu próprio sorriso é que se esconde a alegria da risada.

Ela simplesmente me acompanhava. Ou eu a seguia, não sei.

Ao mesmo tempo que era Ela, era eu. E ela estava em mim. E girava comigo, e sentia, e se apaixonava, e era ela, e era eu.

E desde então ela se fez presente. Mesmo nas noites mais escuras, sua face estampada no céu me acompanha e me dá a certeza que a Dança continua.

E quando ela não surge no Céu, posso encontrá-la em meu ventre. No calor intenso que se move e faz tudo acontecer.

Posso encontrá-la em mim mesma, porque um dia, em uma dança, eu era Ela, e Ela era eu.

Flávia. (29/08/07)

Um comentário:

  1. olá,
    fiquei fascinada com a paixão com que foi escrito este texto, fascinada não pela metáfora com a qual eleva a dança à categoria de divindade mas sim por me rever num sentimento como o seu por esta vertente da arte.
    uma vez que encontrei este blog queria dizer que se é bailarina de profissão mesmo sem a conhecer sou já ademiradora. Provavelmente nunca poderei chegar a profissional nem concretizar os projectos que gostaria pois não tive hipotese de frequentar as escolas que existem.
    Sigo como coreografa a nível amador esperando por o dia em que serei como vocês que todos os dias se entregam à Dança de corpo e alma fazendo dela o vosso sustento...

    felicidades e muitos sucessos

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