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terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Samba na caixa de fósforos

Por trás da minha caneca de chopp, eu a via. Vestida da certeza que pegou emprestada de promessas ouvidas e elogios baratos. Dos lábios carnudos e rosados, envolvidos por aquela pele branca, lisa e macia que tantas vezes afaguei, o nome do sujeito saia como um acorde destoante em uma canção antiga, um samba que batuquei numa caixa de fósforos a guisa de um quadril qualquer que não lembro sequer o ritmo.

Mas o que importa é que ela estava ali, emoldurada pelo vermelho do seu vestido de alças diminutas, falando comigo – seu amigo, desde que o mundo é mundo – sobre o cara lá. Aquele que compôs uma música para ela. Mas eu também docinho, só não tive chance de cantarolar no seu ouvido. Falando do sujeito que a fez, por fim, abandonar esta vida de perambule pra cima e pra baixo na busca do amor peremptório. E o que tem de peremptório no amor, morena? Deixa eu te mostrar que a vida não é tê-a-tê, não é oito ou oitenta. Vou encontrar um 40 de equilíbrio, ou um meia-nove de falta de vergonha, mas não permita que esse moço chegue assim e tire você do seu eixo, dos meus seixos, da nossa voz. Não abra espaço para ele se instalar no seu coração, o deixe no meio das pernas, nunca entre os braços.

E enquanto traçava o dedo pela borda do copo, eu tive um sobressalto. A vida passava pela janela, e eu carolinando, não via Não percebia que não queria que ela fosse embora, passando pelas cadeiras, requebrando seu corpo para longe de mim numa dança suave e hipnotizante para não esbarrar em ninguém. Esbarre em mim, me dê aquele sinal. Enfie sua mão por baixo da minha blusa quando eu te abraçar, ou vire o rosto micro decibéis em direção ao meu. Três milímetros e tocava sua boca, três metros e correria atrás, mais três doses e eu teria coragem, três segundos e eu perdi o tempo. E o outro lá, sorrateiro foi se achegando, milímetro a milímetro no pericárdio dessa menina.

E na falta de resposta para o meu insensato “por quê?”, eu fiz uma curva acelerando demais e cai na rua errada. Quem ama não quer ‘porque’. O ‘Porque’ é o estratagema dos covardes.



Inspirado pela música: ‘O mundo é um moinho’ – Cartola. - Originalmente escrito para a oficina de textos da Maíra Viana

3 comentários:

  1. Obrigada Max!!
    Estes dias o movimento aqui tá fraco rsrs. Estou participando de uma oficina de criação literária, ai estou a todo vapor lá!

    Fico feliz que tenha gostado!

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