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domingo, 20 de fevereiro de 2011

Não se assuste benzinho, é uma questão de neurônios!

No turbilhão que é minha cabeça fêmea, emaranhada na hera daninha da insegurança nossa de cada dia, me belisco a todo instante num esforço dantesco de provar que berimbau não é gaita e que vez ou outra, a vida esbarra no faz de conta e um conto de fadas acontece.


Enquanto remexo suas panelas, pico cebola e brigo com a torneira maluca da sua cozinha, me pego pensando em como seria bom, só por hoje, e por alguns instantes, brincar que é pra valer. Transmutar em verdade essa mentirinha sincera que tem sido só sorrisos e comichões, e que a gente gosta de aprisionar pra ter tamanho de caber na palma da mão apenas, nada de preencher um coração cansado de fazer origami para passar o tempo.


Dobro meus olhares e suas camisas e me aninho preguiçosa no ninho perfeito que é seu braço apoiando meu pescoço, e minhas costelas esquerdas encontrando as suas direitas, num direito que conquistei e que não sei se é meu.


Desenho seu rosto com as pontas dos dedos, e tracejo você na minha memória, para aprisionar nesta aquarela o efêmero de tudo isso e criar algum respaldo que resguarde meu peito calejado de buscar no palheiro a agulha de uma esperança qualquer.


Gosto de passar meu hidratante preferido nas tuas costas e assim me perdôo por arranhá-las sem dó nem ré, em um rompante que é tão meu e que vem por você. E assim gasto creme e tempo na sua pele, e te dou mais alguns hectares dessa alma de mulher que resolveu ser tua mesmo que meu cérebro gritasse não: Os 4 bilhões de neurônios que você tem a mais te dão certezas que nunca serão minhas.

Só pra começar

Teve aquele dia que você falou, mas era tequila demais e certeza de menos soando como uma confissão de amor do álcool, não sua. E enquanto você deixa de dizer, eu fico engolindo a seco todas as vezes que junto aquelas três micro palavrinhas no meu hipotálamo, e não posso cuspi-las na sua cara. E sinto aquela raiva congênita pela sua pouca coragem de cair de cabeça nessa besteira melodramática que os famintos chamam de paixão.


Eu tinha falado dias antes, no momento mais inapropriado o possível: nós dois na cama e você por cima. Posição ideal para usar sua destreza de macho alfa e pular fora dessa canoa furada que eu insistia em remar. Mas você me olhou com aquelas duas jabuticabas e sorriu seu risinho mais jocoso, como quem tivesse escutado “você é the Best of world na cama”, e calou assim seu medo de ter que dizer qualquer coisa que soasse como a entrega de um “também”.

Choraminguei minhas mazelas comigo mesma, juntei meu amor próprio numa tigela e parti do seu teto em direção ao meu deserto de dúvidas secas. E metamorfoseei meu ‘eu te amo’ em qualquer coisa mais digerível, como um ‘gosto muito de você’, botando pra dentro essa mentira e transmutando em confiança e auto-crítica o que antes era medo e incerteza. Coisa de uma prosódia mal sucedida, nada mais.

Daí foi fácil olhar seu furo no queixo e soltar aquela desculpa de ‘foi sem querer, coisa de sexo e coisa e tal’. Mas, dolorido demais ouvir que nem levou a sério, sentir seu alívio por não ter que pôr na mala aquela temível construção frasal da língua portuguesa.

E me vi brincando de não dizer o que queria e falar apenas o que você ouviria bem. Acontece que nessa brincadeira passei a desconhecer as rimas, e piso bamba na areia movediça que é amar você e ter que calar com um não.

Coisa mais brega do mundo, fiquei ouvindo aquela música repetidas vezes. Mais do que palavras, era realmente o que queria de você, mas pra começar, um ‘eu também te amo’ já cairia bem.

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Todo fim é rock n' roll

Bateu a porta com toda sua força, como se aquilo representasse um ponto final. No fundo do peito, a esperança fixa de que ele interpretasse como uma vírgula, e em seguida corresse atrás dela como nas comédias românticas que assistiram tantas vezes juntos.

Imaginou-se procurando as chaves do carro: que estariam na bolsa, e cairiam no chão. Resultado de dedos trêmulos. Mas as mãos estavam firmes, e abriu a porta do carro sem maiores transtornos. Do lado de dentro do veículo um calor de entorpecer neurônios. Nada do frio avassalador que esperou sentir, e que caia tão bem a fins de romances e cenas onde a mocinha percebia o peso cruel do adeus.

Olhou pelo para-brisa a janela do 3º andar, esperava vê-lo. Debulhando-se em lágrimas e implorando aos berros que ela voltasse a bater suas portas, vestir suas camisetas e deixar as toalhas molhadas em cima da cama: Nada disso. A janela aberta anunciava as cores da TV projetando-se na parede: Aquele Filho da mãe está vendo televisão enquanto eu vou embora?

Girou a chave e tentou arrancar o carro. Não olhou para nada e acabou esbarrando no automóvel da frente. Nesse momento nenhuma olhadela para a 3ª janela. Porque ai sim sabia que ele estaria olhando e rindo horrores de sua habilidade fracassada com manobras. Deprimente.

Desceu, avaliou o estrago e com sua letra de escrever cartas de amor, deixou um bilhete com seu telefone grudado no limpador de para-brisas. Voltou, arrancou, saiu pela cidade deixando pra trás mais um amor sem sentido.

Porque todos os fins tem que ser trágicos e apoteóticos? As coisas não poderiam ser mais bossa nova e menos rock n’ roll?

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