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terça-feira, 29 de julho de 2008

Lucidez e Loucura: Metades de um mesmo caramelo.

A lucidez, fantasiada de advogada, andava cabisbaixa pela mesma avenida. Havia ido ao mesmo bar, se sentado ao balcão e o barman sorridente de todas as noites veio atendê-la.

- O de sempre senhora? – ele disse em sua voz convidativa e alegre.

Ela meneou a cabeça dizendo que sim. Vinha ali todos os dias, nunca falava com ele, e ele servil, tinha sua gentileza inabalável.

Lucidez simplesmente não podia entender como é que ele não percebia que ela nem se quer abria a boca! Ficou carrancuda em seu canto, sentindo o suor escorrer por baixo de sua capa de tweed, mais apropriada a um frio invernal do que ao calor daquela noite. Mas a discrição tem alguns impropérios. Queria passar incógnita. Cinza. E não conseguiu.

As portas do bar se abriram estrondosamente e vestida com sapatilha de ponta, vestido rodado e um sorriso no rosto lá estava ela. Era a razão da lucidez ir todas as noites àquele lugar mal freqüentado e muito colorido.

Ela chegou como todas as noites. Cumprimentou a todos no curto espaço da porta ao palco. Rodopiou entre as mesas para alegria de todos. Chegou ao balcão bem ao lado da lucidez, sorriu ao garçom e cumprimentou-o pulando por cima da bancada e beijando-lhe as bochechas ruidosamente.

Bebeu refrigerante e comeu chocolate, e ninguém se importou ou comentou o fato dela se sentar-se à mesa ao invés da cadeira, simplesmente porque gostava de balançar as pernas ao ar.

A lucidez sentia-se bem e mal ao lado dela. Bem pois ela era completamente louca. E mal porque ela era completamente louca MESMO.

Depois do banquete a jovem com a sapatilha de ballet sentou se ao lado da lucidez.

- Você vem aqui sempre!

Não era uma pergunta, então a carracuda lucidez se pôs e examinar seu copo e faezr cara feia.

- Você é sempre assim?

- Assim como? – Ela retrucou. Como aquela menina era irritante!

- Assim triste. Nunca dança, nunca ri. – disse a menina.

- Sou adulta.

A loucura riu. Jogou a cabeça para trás com seu riso. Rolou da cadeira e quase caiu no chão. Riu ainda mais.

Puxou a lucidez pela mão e colocou-a para dançar. A capa da advogada voou pelo ar quando a lucidez começou a se soltar e o calor do ambiente tomou conta.

Ela se sentia livre. Feliz.

Mas a música acabou e a Lucidez pegou o casaco e foi embora. Loucura distraída pela nova música que começava, nem percebeu.

E hoje Lucidez caminha cabisbaixa pela rua. E foi ao mesmo bar. Bebeu a mesma bebida. Mas seu coração acelerado, pulando no peito, mostrava que ela havia provado uma sensação nova e inebriante.

[E foi assim que a Lucidez começou a se misturar com a Loucura.]

segunda-feira, 28 de julho de 2008

O exercício da escolha

Hoje falo de escolhas. Elas sempre existem. Elas estão bem ali. E temos que começar a escolher o que é certo, ao invés daquilo que é simplesmente fácil. Colocarmos a prova nossas próprias escolhas, e pararmos de permitir que outros sofram por atitudes nossas.
Sempre me afligi com as escolhas. Ponderar é uma tarefa árdua, que requer tempo, experiência e uma visão clara e total. Nem sempre tive a experiência para tal, ou outras vezes me faltava à visão, outras meu tempo e necessidade me exigiam mais e as escolhas tinham que ser rápidas.

As escolhas hoje não me incomodam. Tomá-las é sempre a parte mais complicada, porém, depois que decido, simplesmente sigo-as.
Quando era criança, adorava colocar um alfinete na boca. Era um desafio e tanto tentar dobrá-lo com os dentes, transformá-lo em uma bolinha... E evitar que ele furasse minha gengiva nesse um tanto quanto masoquista, esporte.

Às vezes eu simplesmente achava que tinha engolido-o. Haviam me corrigido o suficiente sobre esse mau hábito para que eu corresse e contasse a alguém meu medo.
Nessas horas eu fazia o exercício da escolha.

Eu me perguntava: O que de pior pode acontecer se eu tiver engolido?
O que vai acontecer se eu contar pra minha mãe?
É melhor que eu conte?

E ia esmiuçando as dúvidas. No fim, eu chegava à feliz conclusão que devia ter sido apenas meu medo que me fez pensar que havia engolido. E chegando à mesa onde estava o alfinete... Não é que ele estava lá? Dobrado, molhado. E eu jurava pra mim que não ia mastigá-lo de novo.

Sorte que sabemos que promessas de criança não duram muito.

É inevitável que escolhamos um caminho, uma direção. Que escolhamos um lado, uma cor do arco íris. Às vezes a vida nos cobra de maneira violenta uma escolha.
É fácil saber que nem sempre faremos a escolha certa. É humano aceitarmos que nossas escolhas podem ser erradas, e isso torna mais fácil corrigi-las.

O importante é não se manter estático. É participar da rotação do mundo. É aprender com suas escolhas.

E sabe, se aprendi uma coisa com meu exercício da escolha, é que ninguém aprende com a experiência do outro! É ralando nosso próprio joelho que entendemos o tamanho de nossas pernas para o salto que pretendemos dar.

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